Oriente Médio cada vez com mais fome de armas

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A Arábia Saudita é o quinto maior importador de armas do mundo. Entre 2004 e 2008 ocupava o 18º lugar. Foto: Rádio Nederland Wereldomroep/cc by 2.0

 

Nações Unidas, 20/3/2014 – O Oriente Médio continua sendo um dos mercados de armas mais lucrativos do mundo, e duas nações do Golfo encabeçam a lista mundial de grandes importadores: Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos (EAU). Entre 2009 e 2013, 22% das transferências de armas para a região foram para os EAU, 20% para a Arábia Saudita e 15% para a Turquia, segundo estudo publicado no dia 17 pelo Stockholm International Peace Research Institute (Sipri). Os Estados Unidos forneceram 42% de todo armamento recebido na região nesse período, afirma o estudo.

O apetite armamentista é atribuído a vários fatores, que incluem a percepção de um potencial perigo no Irã, as crescentes divisões entre muçulmanos xiitas e sunitas, um temor generalizado pelo terrorismo, a instabilidade política e a elevada renda obtida com o petróleo.

“É uma mistura de todos esses fatores”, disse Nicole Auger, analista militar encarregado do Oriente Médio e da África na empresa de investigação de mercados de defesa Forecast International, com sede nos Estados Unidos. O mercado do Oriente Médio está crescendo de maneira notável pelo descontentamento da população, pela instabilidade internacional, em especial entre Irã e os países do Golfo, e os altos preços do petróleo, acrescentou o analista à IPS.

Toby C. Jones, professor associado de história na Universidade Rutgers, afirmou à IPS que “o Golfo é o Eldorado para os comerciantes de armas ocidentais e para os governos que querem reciclar um pouco da riqueza gerada pelo petróleo”. Não há um conjunto de países com mais dinheiro e mais entusiasmo por adquirir armamento caro do que os do Golfo, ressaltou.

Seja qual for o valor estratégico que tenham essas armas, é importante considerar que são majoritariamente inúteis para uma guerra “real”, e por isso os Estados Unidos continuam mantendo

uma enorme presença militar na região, acrescentou Jones. “Não há virtualmente nada mais que os Estados possam comprar e que lhes permita reciclar um pouco do dinheiro que é abundante no Golfo”, apontou.

As vendas de armas geram muitos benefícios, disse Jones, ex-membro do Projeto Petróleo, Energia e Oriente Médio da Universidade de Princeton, e autor do livro Desert Kingdom: How Oil and Water Forged Modern Saudi Arabia” (Reino do Deserto: Como o Petróleo e a Água Forjaram a Moderna Arábia Saudita).

O Irã, impossibilitado de comprar a maioria das grandes armas devido às sanções impostas pela Organização das Nações Unidas (ONU), adquiriu apenas 1% das importações de armamentos da região no período 2009-2013, segundo o Sipri. No mesmo período, os EAU ocuparam o quarto lugar entre os maiores importadores de armas do mundo e a Arábia Saudita o quinto (entre 2004 e 2008 estava em 18º alugar). Os três primeiros importadores foram, pela ordem, Índia, China, Paquistão.

Os cinco principais fornecedores de armamento no período 2009-2013 foram Estados Unidos, com 29% das exportações mundiais, Rússia, com 27, Alemanha com 7, China com 6%, e França com 5%.

O principal interesse atual do Oriente Médio em modernizar ou adquirir sistemas antimísseis se deve ao medo de potenciais ataques por parte do Irã. Este país parece ser a principal razão para o Conselho de Cooperação para os Estados Árabes do Golfo tentar criar um comando militar conjunto apoiado pelos Estados Unidos, afirmou Auger. Os países do Conselho são Arábia Saudita, Bahrein, EAU, Kuwait, Omã e Catar.

A segurança interna é o segundo fator, depois dos levantes pró-democráticos de 2011, pela persistente instabilidade em certos países e pelo perigo que se percebe em grupos fundamentalistas estabelecidos ou emergentes, segundo Auger. “Isso é evidente no novo interesse pelas operações especiais, pela vigilância eletrônica e por equipamentos de cibersegurança”, ressaltou. Além disso, a abundante disponibilidade de recursos que têm estas nações exportadoras de petróleo também tende a jogar sua parte, acrescentou.

A venda norte-americana de armas no ano passado, no valor de US$ 10,5 bilhões, uma das maiores dos últimos anos no Oriente Médio, incluiu 26 aviões caça F-16 para EAU e sofisticados mísseis antiaéreos e ar-terra para a Arábia Saudita. Esses mísseis são para equipar 154 aviões de combate F-15 que começarão a ser entregues em 2015 e que foram comprados dos Estados

Unidos em 2010 pela assombrosa quantia de US$ 29,5 bilhões. Os mísseis são destinados a “enfrentar o perigo que representa o Irã”, segundo um alto funcionário norte-americano citado em um artigo.

O fabuloso contrato de armamento incluiu também mil bombas antibunker GBU-35 para a Arábia Saudita e cinco mil para os EAU. Esses explosivos estão concebidos para destruir instalações nucleares subterrâneas. Apesar dessas vendas a nações do Oriente Médio, Washington sempre afirma que continuará “garantindo a vantagem militar qualitativa de Israel” sobre os países árabes.

Segundo Jones, os Estados do Golfo são politicamente vulneráveis no âmbito doméstico, e os três últimos anos são prova disso. Embora o Golfo não tenha vivido as revoluções que afetaram outros países do Oriente Médio e do norte da África, regimes como o de Riad estão nervosos diante da possibilidade de um contágio do fervor revolucionário.

“Sempre esteve, mas a ansiedade é mais marcante agora. De modo que comprar quantidades de armas costuma estar relacionado com o controle interno e as medidas de contrainsurgência”, pontuou Jones. E muito pouco provável que esse armamento seja usado de verdade em um conflito regional, ressaltou.

Para Jones, mesmo os sistemas complexos e de longo alcance têm pouco a ver com o interesse desses países em fazer guerra ao Irã ou mesmo em se defender dele. “Para isso, têm os Estados Unidos”, afirmou. Mas, ao comprar esse armamento, os países do Golfo também indicam que estão atentos aos problemas energéticos dos Estados Unidos em uma vizinhança perigosa.

“Esses são argumentos enganosos, concebidos para reforçar a inquietação norte-americana sobre os perigos da região e garantir que seja mantida sua presença militar”, destacou Jones. Os Estados árabes necessitam que a “crise” seja uma condição permanente para maximizar o compromisso ocidental, e em especial de Washington, com a segurança regional, exista ou não tal crise, enfatizou. Envolverde/IPS

Thalif Deen

Thalif Deen, IPS United Nations bureau chief and North America regional director, has been covering the U.N. since the late 1970s. A former deputy news editor of the Sri Lanka Daily News, he was also a senior editorial writer for Hong Kong-based The Standard. He has been runner-up and cited twice for “excellence in U.N. reporting” at the annual awards presentation of the U.N. Correspondents’ Association. A former information officer at the U.N. Secretariat, and a one-time member of the Sri Lanka delegation to the U.N. General Assembly sessions, Thalif is currently editor in chief of the IPS U.N. Terra Viva journal. Since the Earth Summit in Rio de Janeiro in 1992, he has covered virtually every single major U.N. conference on population, human rights, environment, social development, globalisation and the Millennium Development Goals. A former Middle East military editor at Jane’s Information Group in the U.S, he is a Fulbright-Hayes scholar with a master’s degree in journalism from Columbia University, New York.

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