Armas acabam nas mãos do Estado Islâmico

Estados Unidos e Rússia vendem armamentos para Iraque e à Síria, podem acabar em poder do Estado Islâmico (EI) e de outros grupos extremistas. Foto: Wikimedia Commons

Estados Unidos e Rússia vendem armamentos para Iraque e à Síria, podem acabar em poder do Estado Islâmico (EI) e de outros grupos extremistas. Foto: Wikimedia Commons

Por Thalif Deen, da IPS

Nações Unidas, 29/9/2015 – Os Estados Unidos e a Rússia aumentaram as vendas de armas ao Iraque e à Síria, dois de seus aliados no Oriente Médio, apesar do temor de que parte desse armamento acabe em poder do Estado Islâmico (EI) e de outros grupos insurgentes que combatem forças governamentais.

Entre as vendas previstas dos Estados Unidos para o Iraque, por mais de US$ 15 bilhões, estão 175 tanques Abrams e mil veículos blindados Humvee, junto com aviões de combate, helicópteros de ataque e mísseis guiados por laser. Por sua vez, a Rússia reforçou recentemente o assediado governo sírio do presidente Bashar al Assad com aviões de combate, helicópteros artilhados e de transporte, seis tanques de combate T-90, 15 obuses e 35 veículos blindados de transporte de pessoal, segundo informações publicadas.

Mas os beneficiários finais poderiam ser grupos insurgentes – entre eles o extremista EI, a rede Al Qaeda e a Frente Nusra –, que poderiam capturar essas armas ou confiscá-las das forças militares, que já abandonaram seus armamentos várias vezes no passado, ao fugir do campo de batalha.

O jornal norte-americano The Wall Street Journal informa que alguns legisladores dos Estados Unidos, conscientes dos riscos, condicionam sua aprovação à venda de armas para o Iraque às “garantias de que elas não caíam em mãos do inimigo”. Está previsto que o presidente norte-americano, Barack Obama, e o seu colega russo, Vladimir Putin, mantenham conversações bilaterais, concretamente sobre o futuro da Síria, em Nova York, onde discursarão, no dia 28, na 70ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, afirma que a guerra civil síria, que começou em março de 2011, só pode ser resolvida politicamente e não pelas armas.

Washington protestou pelo envio de novas armas ao governo de Assad, mas Moscou sustenta que só cumpre os contratos militares que assinou com a Síria, que é um aliado militar desde a época de Hafez al Assad (1971-2000), pai do atual mandatário sírio. Segundo fontes de inteligência dos Estados Unidos, a Rússia também responde pela escalada militar na cidade portuária de Latakia, ao instalar quartéis com capacidade para alojar até duas mil pessoas, presumivelmente para assessores russos.

Patrick Wilcken, pesquisador da Anistia Internacional, afirmou à IPS que a maioria das armas em poder dos grupos insurgentes “foi capturada em campo de batalha”, especialmente do arsenal iraquiano, durante os avanços do EI em 2014, quando o grupo extremista tomou as bases militares de Faluja, Mosul, Tikrit e Ramadi, mas também na Síria, quando se apoderou das bases de Raqqa e Tabaqa.

Embora seja praticamente impossível rastrear o armamento utilizado pelo EI e por outros grupos armados no Iraque e na Síria, Wilcken assegurou que se pode tirar conclusões gerais com base na evidência disponível, como as imagens, os vídeos e a evidência física obtidos pela organização Investigação sobre Armamentos de Conflitos.

A maior parte das armas que circulam atualmente na Síria e no Iraque é de produção soviética ou de países que pertencem ao Pacto de Varsóvia, como variantes do rifle de assalto AK, que é fabricado em todo o mundo, explicou Wilcken. Muitas dessas armas têm mais de 20 ou 30 anos, e algumas são da guerra entre Irã e Iraque (1980-1988), ou mesmo anteriores, acrescentou.

Também se começa a ver armas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), quando os militares iraquianos, já sob a ocupação dos Estados Unidos, se equiparam com armas leves dessa aliança militar, acrescentou Wilcken. Quando, em outubro de 2014, o EI capturou um tesouro de armas norte-americanas das mãos de soldados iraquianos que haviam fugido, um dos líderes insurgentes declarou, ironicamente: “Esperamos que os norte-americanos cumpram seus acordos e forneçam serviços aos nossos helicópteros”.

Alguns dos ataques aéreos dos Estados Unidos contra objetivos do EI, paradoxalmente, foram contra helicópteros de fabricação norte-americana, Humvees, veículos blindados e peças de artilharia antiaérea fornecida originalmente para as forças armadas iraquianas e atualmente em poder do grupo extremista. Não é de surpreender que todos tenham a garantia de manutenção e reparos dos Estados Unidos.

O mercado negro prosperou no Iraque desde a queda de Saddam Hussein, e continua crescendo, segundo Wilcken. Há algumas provas de corrupção do exército sírio já que, por exemplo, munições fabricadas na Rússia acabaram no arsenal do EI, não só mediante sua captura, mas também por meio de vendas, assegurou o ativista. “Uma grande quantidade de intercâmbio de armas foi conseguida com as deserções do exército e das fusões de grupos armados”, pontuou.

“A proliferação de armas na região tem um extenso pedigree – ao menos do lado iraquiano – e os futuros Estados fornecedores precisarão ter muito cuidado para evitar uma maior proliferação regional e suas consequências catastróficas”, alertou Wilcken.

Segundo o meio noticioso Defense News, com sede em Washington, a venda de armas ao Iraque em 2014 também incluiu 681 mísseis antiaéreos Stinger, 40 caminhões lança-mísseis, radares Sentinel, três baterias antiaéreas com 216 mísseis Hawk, 50 porta-tropas Stryker, 12 helicópteros e centenas de milhões de dólares em manutenção e apoio logístico para milhares de veículos militares fabricados nos Estados Unidos.

Além disso, Washington também acordou a venda de mísseis Hellfire, tanques Abrams M1A1, metralhadoras, rifles de franco-atirador, granadas e munições por milhares de milhões de dólares. Ninguém sabe quanto desse armamento acabará em poder das forças insurgentes. Envolverde/IPS

Thalif Deen

Thalif Deen, IPS United Nations bureau chief and North America regional director, has been covering the U.N. since the late 1970s. A former deputy news editor of the Sri Lanka Daily News, he was also a senior editorial writer for Hong Kong-based The Standard. He has been runner-up and cited twice for “excellence in U.N. reporting” at the annual awards presentation of the U.N. Correspondents’ Association. A former information officer at the U.N. Secretariat, and a one-time member of the Sri Lanka delegation to the U.N. General Assembly sessions, Thalif is currently editor in chief of the IPS U.N. Terra Viva journal. Since the Earth Summit in Rio de Janeiro in 1992, he has covered virtually every single major U.N. conference on population, human rights, environment, social development, globalisation and the Millennium Development Goals. A former Middle East military editor at Jane’s Information Group in the U.S, he is a Fulbright-Hayes scholar with a master’s degree in journalism from Columbia University, New York.

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