Abusos da Arábia Saudita são ignorados

O falecido rei Abdalá (esquerda) e seu irmão mais novo, Salmão bin Abdulaziz, o monarca da Arábia Saudita. Foto: Tribes of the World/cc by 2.091

O falecido rei Abdalá (esquerda) e seu irmão mais novo, Salmão bin Abdulaziz, o monarca da Arábia Saudita. Foto: Tribes of the World/cc by 2.091

Por Thalif Deen, da IPS – 

Nações Unidas, 19/1/2016 – As potências ocidentais mantêm seu apoio político e militar à Arábia Saudita, um de seus maiores aliados no Oriente Médio, apesar de uma coalizão de países liderados pelo reino saudita ser acusada de lançar bombas de fragmentação, que são proibidas, sobre objetivos civis no vizinho Iêmen. A coalizão também teria destruído hospitais no território iemenita com armas fornecidas, em sua maior parte, por Estados Unidos, França e Grã-Bretanha.

O Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos destacou que, somente em dezembro, o conflito armado no Iêmen custou a vida de 81 civis e causou ferimentos em 109. As autoridades calculam que mais de 2.800 civis morreram e 5.300 ficaram feridos devido às hostilidades entre os dias 26 de março e 31 de dezembro.

Embora as potências ocidentais tenham condenado e sancionado outros países acusados de massacres civis, não tomaram nenhuma medida contra a Arábia Saudita e seus sócios da coalizão, entre eles Bahrein, Egito, Emirados Árabes Unidos, Jordânia, Marrocos, Sudão, Kuwait e Catar.

A Arábia Saudita constitui um mercado de milhares de milhões de dólares para os vendedores de armas britânicos, norte-americanos e franceses, que fornecem ao país aviões de caça, helicópteros, mísseis, carros de combate e sistemas bélicos eletrônicos de avançada tecnologia.

De procedência norte-americana, o arsenal saudita inclui caças Boeing F-15, helicópteros Bell, Apache e Sikorsky, sistemas aerotransportados de advertência Boeing E-3A, mísseis Sidewinder, Sparrow e Stinger, e tanques Abrams e M60.O paístambém conta com helicópteros Aerospatiale, Puma e Dauphin, e aviões de combate Tornado, produzidos por França e Grã-Bretanha, respectivamente.

Natalie J. Goldring, pesquisadora em estudos de segurança da Universidade de Georgetown, com sede em Washington, assegurou à IPS que o governo dos Estados Unidos há anos documenta os abusos de direitos humanos cometidos pela Arábia Saudita. “Mas os Estados Unidos continuam fornecendo ao governo saudita uma linha de armamentos em grande parte ilimitada. É hora de agir segundo o Tratado sobre Comércio de Armas e suas próprias leis e suspender a transferência de armas para a Arábia Saudita”, destacou.

A avidez por lucro dos fabricantes de armas norte-americanos não deve conduzir a política militar e externa de Washington, pontuou Goldring. “Os riscos para o pessoal militar e paraos interesses dos Estados Unidos deveriam ter muito mais peso na tomada de decisões”, ressaltou.

O último número da revista Time assegura que a Arábia Saudita gasta relativamente mais com defesa do que qualquer outro país, com 11% de seu produto interno bruto, em comparação com os 3,5% dos Estados Unidos. “Queima US$ 6 bilhões por mês para bombardear o Iêmen, uma guerra desaconselhável que chegou a definir a abrupta mudança por parte do rei Salmán (bin Abdulaziz) desde que assumiu o trono”, em janeiro de 2015, afirmou a revista.

Mas é provável que esse gasto militar diminua no futuro, devido à forte queda nos preços do petróleo – a principal exportação da Arábia Saudita –, que na semana passada caíram para menos de US$ 30 o barril, contra os US$ 110 do início de 2014.

Segundo o Instituto Internacional de Estocolmo de Pesquisa para a Paz, no período 2010-2014, Estados Unidos e Grã-Bretanha foram os principais fornecedores de armas para a Arábia Saudita. Os britânicos responderam por 36% das entregas de armas ao reino saudita, contra 35% por parte dos norte-americanos. A França ficou com 6%, em um distante terceiro lugar.

Em um artigo publicado pela revista norte-americana Counter Punch, em novembro, William D. Hartung, do Centro para a Política Internacional, afirma que o recente aumento nas transferências de armas dos Estados Unidos parao Oriente Médio faz parte de um auge sem precedentes na venda de armas que se produziu durante a presidência de Barack Obama.

“A maior parte das vendas de armas pela administração Obama foi parar no Oriente Médio e no Golfo Pérsico, e a Arábia Saudita encabeça a lista com mais de US$ 49 bilhões em contratos novos”, diz o artigo. “Isso é particularmente preocupante devido à complexa série de conflitos existentes na região e pelo uso que o regime saudita dá às armas fornecidas pelos Estados Unidos em sua intervenção militar no Iêmen”, acrescenta Hartung.

A administração Obama fez da venda de armas uma ferramenta central de sua política externa, em parte como forma de exercer influência militar sem precisar colocar “as botas no terreno” em grande quantidade, como fez o governo de George W. Bush (2001-2009) no Iraque, com consequências desastrosas, acrescentou o especialista.

Segundo Hartung, “as vendas parao exterior não só reforçam os lucros das empresas, como também ajudam a manter abertas as linhas de produção que, de outra forma, teriam que fechar devido à redução nos pedidos do Pentágono”.Por exemplo, nos primeiros dias do ano,foi divulgado que a Boeing venderia 40 caças F-18 ao Kuwait, o que estenderá a vida de produção desse produto em particular por um ano ou mais além de sua data atual de finalização, prevista para o começo de 2017.

Do mesmo modo, o tanque M-1 da General Dynamics sobrevive graças a uma combinação de complementos do Congresso norte-americano e um contrato com a Arábia Saudita.“Mas não se trata apenas de dinheiro. As armas fornecidas pelos Estados Unidos avivam o conflito na região. As vendas recentes mais preocupantes se referem a um acordo em processo que fornecerá mais de US$ 1 bilhão em bombas e mísseis à força aérea saudita, novamente para seu uso na guerra no Iêmen”, denunciou Hartung. Envolverde/IPS

Thalif Deen

Thalif Deen, IPS United Nations bureau chief and North America regional director, has been covering the U.N. since the late 1970s. A former deputy news editor of the Sri Lanka Daily News, he was also a senior editorial writer for Hong Kong-based The Standard. He has been runner-up and cited twice for “excellence in U.N. reporting” at the annual awards presentation of the U.N. Correspondents’ Association. A former information officer at the U.N. Secretariat, and a one-time member of the Sri Lanka delegation to the U.N. General Assembly sessions, Thalif is currently editor in chief of the IPS U.N. Terra Viva journal. Since the Earth Summit in Rio de Janeiro in 1992, he has covered virtually every single major U.N. conference on population, human rights, environment, social development, globalisation and the Millennium Development Goals. A former Middle East military editor at Jane’s Information Group in the U.S, he is a Fulbright-Hayes scholar with a master’s degree in journalism from Columbia University, New York.

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