Jovens deficientes sem orientação sexual

Os adolescentes com deficiências físicas também têm dúvidas sobre seus corpos e pensam em manter relações sexuais, como qualquer jovem. Foto: Melody Kemp/IPS

Os adolescentes com deficiências físicas também têm dúvidas sobre seus corpos e pensam em manter relações sexuais, como qualquer jovem. Foto: Melody Kemp/IPS

Por Lyndal Rowlands, da IPS – 

Nações Unidas, 11/7/2016 – Desde esterilização forçada até abuso sexual, homens e mulheres jovens com deficiências físicas têm maiores probabilidades de seus direitos sexuais e reprodutivos serem violados em comparação com outros setores da população. Apesar dos crescentes riscos que esses jovenssofrem, também é muito menos provável que recebam a educação em saúde sexual que tanto necessitam.

Muitas vezes essa situação se deve ao fato de cuidadores não terem consciência das necessidades nem dos desejos sexuais das pessoas com alguma deficiência, explicou à IPS Malin Kvitvaer, da Associação Sueca para a Educação Sexual. “Só se vê a surdez e se esquece de que também há uma pessoa jovem”, observou.

Pais e cuidadores às vezes se esquecem de que os adolescentes com deficiências também têm dúvidas sobre seus corpos e pensam em relações sexuais, como qualquer jovem, indicou Kvitvaer, que é surda e trabalha em um projeto destinado a melhorar a educação sexual em língua de sinais. “E, mesmo quando recebem educação em saúde sexual, pode ocorrer de esta ser incompleta ou inadequada pelas dificuldades de acesso a ela”, acrescentou.

“Há muitos casos de professora, ou professor, que não domina a linguagem de sinais,e não sabe como dar orientação sexual, e acaba dando uma versão muito comprometida ou diretamente a evitam”, ressaltou Kvitvaer.As barreiras na comunicação podem ter um impacto ainda maior, quando os abusadores se aproveitam do fato de as pessoas jovens e surdas terem mais dificuldade para fazer uma denúncia de abuso.

“Na história da comunidade surda, há casos de jovens surdas, também homens, mas principalmente meninas, que sofreram abusos sexuais por homens de seu convívio, como professores, padres surdos e outros”, contouKvtivaer. “Muitas vezes sabiam que as famílias das meninas não usam a linguagem de sinais e elas não poderiam contar sobre o abuso”, acrescentoua ativista, que foi a jovem delegada sueca à Organização das Nações Unidas (ONU) em 2011.

As adolescentes devem enfrentar inúmeros problemas porque suas comunidades, ou suas próprias famílias, só consideram a possibilidade de entregá-las em casamento e priorizam a maternidade. Muitas são obrigadas a abandonar a escola, comprometendo suas perspectivas de futuro. E, mesmo para as que continuam os estudos, pode ser difícil ter acesso a informação básica sobre saúde sexual e reprodutiva e seus direitos humanos em geral, deixando-as em situação vulnerável diante de enfermidades, lesões e exploração.

Os obstáculos são ainda mais graves para as jovens marginalizadas, incluindo as que pertencem a minorias étnicas, bem como para as que vivem na pobreza ou em áreas remotas, e ainda mais para as que têm alguma deficiência física. Mas, quando se fortalece as jovens, quando conhecem seus direitos e têm os meios para poderem se desenvolver, se convertem em positivos agentes de mudança em suas comunidades.

Para chamar a atenção sobre essas dificuldades e, em geral, sobre a necessidade de se promover medidas para o desenvolvimento,em condições de igualdade,de mulheres adolescentes e jovens, o lema do Dia Mundial da População, celebrado hoje, é o investimento em meninas adolescentes.Nós Decidimos (We Decide, em inglês) é uma nova iniciativa, lançada em junho pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), para atender as carências nos serviços de saúde sexual e reprodutiva, educação e informação, que afetam de forma desproporcional as pessoas jovens e com deficiência física.

Leyla Sharafi, especialista em jovens e em gênero do UNFPA, disse à IPS que em todo o mundo os jovens e adolescentes têm dificuldades para acessar serviços de saúde sexual e reprodutiva, e no caso dos deficientes essas barreiras são ainda maiores. “Os jovens com deficiência sofrem maiores riscos de experimentar violência sexual e devem enfrentar barreiras maiores para ter acesso a educação e serviços de saúde sexual e reprodutiva”, pontuou à IPS.

“O UNFPA e o programaWe Decide defendem que todos os jovens com deficiência física tenham seus direitos humanos, incluídos os de não discriminação e o de poder viver uma vida livre de violência”, destacou Sharafi. O programa foi desenhado em colaboração com pessoas jovens deficientes que tomaram por base suas necessidades, acrescentou.Com esse fim, Kvitvaer afirmou que a educação sexual não deve se concentrar apenas nos aspectos negativos do sexo, mas também nos positivos.

“Também creio que é importante não se concentrar somente nos problemas que possam ser causados pelas relações sexuais, como gravidez não desejada e doenças sexualmente transmissíveis, mas também que o sexo é algo bom quando é consensual e não é ruim querer manter relações sexuais, assim como não querer mantê-las”, enfatizouKvitvaer.Nestes dias, comemora-se os dezanos da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que, segundo Sharafi,“é uma das poucas que explicitamente se refere à saúde sexual e reprodutiva”. Envolverde/IPS

*Este artigo integra uma série da IPS por ocasião do Dia Mundial da População, celebrado em 11 de julho.

Lyndal Rowlands

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