Perdas pós-colheita na Tanzânia tornam-se perdas da agricultura juvenil

DAR ES SALAAM, Tanzânia, 19 de junho de 2020 (IPS) – Ao despedir-se de um grupo de amigas, Esther Ishabakaki pergunta se alguma delas conhece um bom alfaiate que possa estar interessado em ingressar em seu novo negócio de roupas. É um empreendimento que ela iniciou há três meses, depois de deixar seu negócio agrícola.

Instalando uma estufa na cidade comercial Dar es Salaam, na Tanzânia, Ishabakaki, 35 anos, resolveu cultivar tomates. Mas uma série de desafios destruiu sua paixão e seus sonhos por um negócio de horticultura. “Eu tinha investido muito: dinheiro, tempo e até emoção. Mas quando você cai a cada obstáculo, chega a um ponto em que você simplesmente desiste. Concluí que seria melhor sair e testar um negócio diferente”, contou Ishabakaki à IPS.

A falta de experiência no cultivo em estufa foi um desafio quando Ishabakaki começou a cultivar tomates. Mas, enquanto suas habilidades melhoraram com o passar do tempo, foram as perdas pós-colheita que ela diz que não conseguiu controlar. Depois de colher produtos perfeitos, Ishabakaki, como muitos milhões de agricultores, enfrentou o desafio de preservar a qualidade e a quantidade de suas colheitas antes de chegar ao consumidor.

O aumento da demanda doméstica por alimentos e o aumento da taxa de desemprego são apenas alguns dos fatores que pressionam os governos africanos a procurar fortalecer o setor agrícola, e a Tanzânia não é exceção. A Organização Internacional do Trabalho (OIT), por exemplo, afirma que o desemprego juvenil na Tanzânia é de 11% atualmente.

Infelizmente, a experiência de Ishabakaki com perdas pós-colheita não é única. Especialistas dizem que isso ressoa com muitos jovens e agricultores em geral no país, e pode estar levando-os a deixar o mercado. “O problema das perdas pós-colheita no setor agrícola é enorme”, destacou à IPS Adella Ng’atigwa, pesquisadora e economista agrícola do Ministério da Agricultura. Como pesquisadora do Instituto Internacional de Agricultura Tropical (IITA), ela está atualmente trabalhando em um resumo que documenta as perdas pós-colheita e as razões para isso, além de esboçar os obstáculos que impedem os jovens de participar do setor agrícola da Tanzânia.

Ng’atigwa observa que algumas culturas são mais afetadas que outras – os repolhos costumam sofrer perdas de até 60%. “Os agricultores de Njombe, no planalto sul da Tanzânia, disseram-me que a baixa demanda é uma das principais causas de perda de produção na área. Mas também notei que o manejo inadequado das culturas e a falta de práticas agronômicas também contribuem para esse problema”, enfatizou.

Perdas pós colheita na Tanzânia tornam se perdas da agricultura juvenil

Comerciantes vendem vegetais no mercado de Darajani, em Zanzibar. Segundo uma pesquisa do IITA, certos produtos, como repolho e tomate, são mais propensos a perdas pós-colheita do que outros. Foto: Alexander Makotta / IPS

Ng’atigwa aponta que condições precárias de transporte e armazenamento, além de embalagens de baixa qualidade também são fatores que influenciam essa situação, mas espera que a cooperação entre o governo e o setor privado ajude a resolvê-la. “A parceria público-privada poderia investir no desenvolvimento de infraestrutura, como construção de locais para embalagem e investimento em agroprocessamento.

“Essa abordagem pode ser usada para aumentar a frequência do treinamento e conscientização dos jovens e a criação de inovações em gerenciamento pós-colheita por meio de agentes de extensão”, argumentou a pesquisadora. Além disso, Ng’atigwa diz que o governo pode reduzir os impostos sobre as iniciativas de gerenciamento pós-colheita, tornando seus serviços mais acessíveis aos agricultores.

O IITA, uma organização sem fins lucrativos que trabalha com parceiros na África para melhorar a qualidade e a produtividade das culturas, está trabalhando para preencher algumas lacunas com relação aos desafios ainda enfrentados pelo setor agrícola. Por meio de seu programa para jovens, o IITA ajuda-os a transformar seus desafios em oportunidades para criar empregos para si e para os outros.

O programa funciona da fazenda ao mercado, começando pela semeadura, e chegando até a comercialização e todo o caminho para processar o produto para consumo. “Temos um programa de incubação, no qual treinamos pessoas para adquirir habilidades para o agronegócio, para o desenvolvimento empresarial, para gerenciar diferentes técnicas e, em seguida, as preparamos para tornarem-se empresários na agricultura”, explicou Victor Manyong, diretor do IITA para a região leste da África.

Manyong acredita que existem muitas oportunidades na agricultura para os jovens ganharem dinheiro, como, por exemplo, aumentando a produção da fazenda. Ele confirma que os jovens desejam aproveitar essas oportunidades, mas geralmente precisam de ajuda ao longo do caminho. “Eles precisam de habilidades técnicas, de empreendedorismo, de negócios. Interagimos com jovens que desejam empreender, mas eles nem sabem como desenvolver um plano de negócios. Existem jovens com boas ideias, mas que não podem desenvolvê-las porque não têm capital”, ressaltou.

Outros especialistas em agricultura concordam com Manyong em que existem muitas oportunidades no setor agrícola para jovens, mas alertam que deve haver um investimento holístico na juventude para ajudá-los a aproveitar essas oportunidades.

Revokatus Kimario, diretor executivo da Cooperativa de Empreendedores de Pós-Graduação da Universidade de Sokoine, da Tanzânia – que prepara, capacita e apoia empreendedores agrícolas inovadores e com conhecimento intensivo –, acredita que a melhor forma para começar é com a mentalidade dos jovens. “Temos que mudar o pensamento das pessoas desde tenra idade, para adotar a agricultura como um negócio, como qualquer outro negócio. Além disso, temos que usar a tecnologia nesse setor, não apenas para atrair os jovens, mas também para aumentar a eficiência na produção”, opinou à IPS.

Quanto às perdas pós-colheita, que continuam desencorajando jovens como Ishabakaki, Kimario argumenta que a solução poderia ser o mercado. Ele indica que os jovens agricultores precisam ser treinados para responder ao mercado com o tipo e volume de culturas que demanda. “O mercado precisa dizer o que produzir, em que quantidade, qualidade e tempo. Se você está produzindo tomates, por exemplo, saberá se o seu mercado deseja produtos frescos ou processados”, explicou.

Alexander Makotta

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