Conselho da ONU quer jornalistas seguros

Jornalistas da Caxemira protestam contra as restrições à liberdade de expressão em 2012. Foto: Athar Parvaiz/IPS

Jornalistas da Caxemira protestam contra as restrições à liberdade de expressão em 2012. Foto: Athar Parvaiz/IPS

Por Tharanga Yakupitiyage, da IPS – 

Nações Unidas, 4/10/2016 – O Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) novamente se manifestou em favor da segurança dos jornalistas depois de adotar uma resolução com medidas para que os Estados garantam a proteção desses profissionais. O órgão já havia aprovado outras três resoluções para a proteção de jornalistas, mas a desse ano é considerada uma das mais completas porque inclui a defesa de direitos como liberdade de expressão e de imprensa.

A resolução “apresenta esses assuntos de forma mais explícita do que as outras”, disse à IPS a diretora de campanha do Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), Courtney Radsch. O documento destaca ainda a responsabilidade dos Estados na violência contra os jornalistas e na criação de um clima permissivo que coloca em risco a segurança dos profissionais.

Para Radsch, “não se trata só de falar da segurança dos jornalistas, mas de atender a necessidade de se criar um ambiente em que a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa possam florescer”. A oficial de comunicações da organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF), Margaux Ewen, concorda com Radsch e afirmou à IPS que a última resolução é uma “maravilhosa reiteração”, que exorta os Estados membros da ONU a implantarem suas obrigações internacionais.

Pela primeira vez o Conselho de Direitos Humanos chamou os países no sentido de libertarem os jornalistas presos de forma arbitrária e reformarem a legislação que limita seu trabalho. Segundo o CPJ, cerca de 200 jornalistas foram presos em 2015. A organização registrou o maior número de detenções na China, país integrante do Conselho de Direitos Humanos e onde 49 profissionais estão presos.

O último caso de repercussão é o de Lu Yuyu e Li Tingyu, dedicados desde 2012 a documentar e registrar os protestos na China, e detidos em junho deste ano por “provocarem lutas e causarem problemas”.

A resolução, adotada em 26 de setembro, também afirma o direito dos profissionais de usarem ferramentas para criptografar informação e preservar seu anonimato. Os jornalistas costumam recorrer a esses mecanismos para difundir na internet de forma segura, e também os usam em suas comunicações, para proteger seus contatos e suas fontes. Radsch destacou que são ferramentas essenciais para que os jornalistas “possam fazer seu trabalho no século 21”.

A resolução também menciona os riscos específicos que enfrentam as mulheres jornalistas e condena os ataques por questões de gênero. No começo de setembro, a jornalista independente Gretchen Malalad e Alindogan-Caudron, corresponde da rede de televisão Al Jazeera,sofreram vários ataques nas redes sociais, que incluíam ameaças de violação e de morte, por sua cobertura sobre a polêmica guerra do governo das Filipinas contra as drogas.

O integrante do Sindicato Nacional de Jornalistas das Filipinas, Ryan Rosauro, expressou sua preocupação pela situação da imprensa em seu país. “Nunca seremos levianos com as ameaças, sejam físicas ou de nos silenciar, porque já perdemos muitos colegas e, nesses casos, quase não foi feita justiça”, afirmou. Em um comunicado conjunto, a Federação Internacional de Jornalistas (FIP) e o sindicato filipino cobram do governo que leve a sério as ameaças nas redes sociais e castigue os responsáveis, a fim de garantir a segurança dos profissionais da imprensa.

Na Classificação Mundial da Liberdade de Imprensa, a RSF situa as Filipinas em 138º lugar entre os 180 Estados pesquisados, o que as converte em um dos países mais perigosos para o exercício do jornalismo. Como em anos anteriores, o Conselho de Direitos Humanos voltou a destacar a necessidade de pôr fim à violência contra os jornalistas e combater a impunidade que gozam os agressores.

O CPJ concluiu que mais de 1.200 jornalistas foram assassinados desde 1992, a maioria dos casos com total impunidade. Outras organizações especulam que o número de profissionais mortos pode ser maior. A FIP afirma que pelo menos 2.300 trabalhadores do setor foram assassinados desde 1990.

Em 2009, o conhecido jornalista e editor do Sri Lanka, Lasantha Wickramatunga foi assassinado a socos após ter sido obrigado a parar seu automóvel por oito homens que usavam capacetes e estavam em motos. Crítico do governo e de sua gestão da guerra civil, o jornalista havia sofrido ataques e recebido ameaças de morte meses antes de seu assassinato. De fato, antecipou seu fatal destino com um curto artigo premonitório sobre o estado da liberdade de imprensa nessa nação da Ásia meridional.

“Nos últimos anos, os veículos de comunicação independentes sofrem cada vez mais ataques. Os meios impressos e eletrônicos foram queimados, bombardeados, fechados e forçados. Inúmeros jornalistas sofreram assédio, ameaças e foram assassinados. Tem sido uma honra pertencer a todas essas categorias e agora, especialmente, a essa última”, escreveu Wickramatunga.

O escritor e jornalista jordaniano Nahed Hattar foi morto em 25 de setembro, com um tiro na cabeça, fora do tribunal onde prestaria depoimento por ter compartilhado no Facebook uma caricatura considerada um insulto ao Islã. “O assassinato de Hattar é terrível, e é inaceitável que não tenham sido tomadas medidas para garantir sua segurança, em particular quando as ameaças contra ele eram bem conhecidas pelas autoridades”, afirmou o relator especial da ONU para a liberdade de expressão, David Kaye.

O relator pediu urgência às autoridades no sentido de processar os responsáveis e se dotar de leis que possibilitem uma cultura de livre expressão de opiniões diversas. Mas Radsch e Ewen disseram que a última resolução do Conselho de Direitos Humanos é apenas um primeiro passo, que ainda precisa ser traduzido em medidas concretas no terreno.“Continuamos sendo testemunhas do fracasso dos Estados na investigação de assassinatos de jornalistas. Embora as resoluções sejam importantes, precisamos de medidas concretas que acompanhem a norma”, destacou Radsch em conversa com a IPS.

Por sua vez, Ewen afirmou que as resoluções da ONU são “fortes e com termos contundentes”, mas é preciso ver se os Estados tomarão medidas para proteger os jornalistas e a liberdade de expressão. De fato, Ewen mencionou a campanha da RSF para criar um representante especial do secretário-geral para a segurança dos jornalistas, como forma de garantir que as autoridades cumpram suas obrigações internacionais.

A campanha encabeçada pela RSF reuniu mais de cem organizações da mídia e de direitos humanos, como o CPJ, o jornal britânico The Guardian e a Associação de Correspondentes das Nações Unidas. O secretário-geral da RSF, Christophe Deloire, declarou que um representante especial pode funcionar como alerta e mecanismo de resposta rápida para que os jornalistas ameaçados tenham acesso às autoridades, e que estas tomem medidas para sua proteção, como assinala a resolução.

Deloire também disse que um representante especial com peso político pode garantir que todas as operações e todos programas das Nações Unidas incluam e prevejam a proteção de jornalistas. “Todas as semanas há novos nomes e túmulos nos cemitérios de jornalistas, e não podemos permitir que morram mais por falta de vontade política”, acrescentou.

O Conselho de Direitos Humanos, de 47 membros, adotou a resolução sobre segurança dos jornalistas por consenso, e expressou sua profunda preocupação pelo aumento do número desses profissionais assassinados, torturados e detidos. Envolverde/IPS

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Tharanga Yakupitiyage

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